La gestión del turismo y sus problemáticas desde visiones sociales
La gestión del turismo y sus problemáticas desde visiones sociales
O Turismo e o Cooperativismo
Luzia Neide Menezes Teixeira Coriolano
Professora Adjunta do Departamento de Geociências
Universidade Estadual do Ceará
Resumo
Este texto analisa o papel das cooperativas no desenvolvimento do turismo em comunidades cearenses. Apresenta bases conceituais do cooperativismo, sua origem e evolução histórica. Situa o cooperativismo como uma constante forma de reação às exclusões geradas pelo modo de produção capitalista. Mostra essa forma alternativa de produzir em cooperação, situando a cooperativa como uma empresa socialista. Por fim apresenta a cooperativa como uma tendência das comunidades pesqueiras do Ceará se organizarem para poder competir no mercado do turismo.
Palavras Chaves: Turismo, comunidade , cooperação , cooperativa, cooperativismo.
Abstract
This text outlines the role of cooperatives in the development of tourism amongst communities in the state of Ceará. It provides the conceptual basis for cooperativism, its origin and historical evolution. Cooperativism is found to be a constant form of reaction to the exclusions generated by the capitalist mode of production. This alternative form of production through cooperation is presented, establishing the cooperative as a socialist enterprise. Finally, the cooperative is presented as a trend amongst the fishing communities of Ceará which are organizing themselves in order to compete in the tourism market.
Key words: tourism, community, cooperation, cooperative, coopérativism.
Cooperativa é uma associação de pessoas livremente unidas sobre a base da igualdade de direitos e responsabilidades, movidas por idéias e estratégias socioeconômicas capazes de promover a justiça social, a solidariedade humana, a ajuda mútua e a administração de bens coletivos, em proveito comum. É uma empresa socialista, como afirma Paul Singer (1998). O posicionamento desse analista é que a cooperativa pode orientar uma saída para a crise atual do desemprego.
O Brasil atingiu níveis de desempregos alarmantes. Ocorreu no país uma transformação profunda nas relações de trabalho, com respeito ao padrão de ocupação, ao emprego com carteira assinada, que requer alternativa de continuidade. Cresce de forma desmedida a terceirização. As cooperativas que proliferam em todo país podem ser uma alternativa de superação da crise.À medida que o capitalismo avança, faz ver alternativas próprias de reação a essa forma de exploração. A maior parte da população economicamente ativa que, até pouco tempo, estava numa situação que permitia ter um emprego assalariado regular, com contrato, tanto no setor privado quanto no público, vê-se agora desempregada. Hoje, a tendência é, uma maior redução do número de empregados. Este vem sendo um dos maiores desafios da sociedade: encontrar trabalho para as vítimas da exclusão.
Os processos de reengenharia, qualidade total, desburocratização e descentralização são também responsáveis pela precarização das relações de trabalho. Cada vez mais, as empresas empregam menos trabalhadores, ficando a maioria na posição de subcontratados, como faz o modelo japonês - o toiotismo, com a produção flexível que passou a ser imitado em diversos setores econômico. É nesse contexto que o cooperativismo ressurge na atualidade e esse novo cooperativismo que está surgindo pelo Brasil afora, é uma continuação das idéias originais do cooperativismo inglês. Diz Singer que a cooperativa foi literalmente reinventada na década de 90, nas mais diversas regiões do país, quando os trabalhadores perderam seus empregos e tiveram que inventar uma forma de solucionar seus problemas, com uma visão coletiva, reinventando a cooperativa.
O turismo é conhecido como uma atividade multiplicadora de empregos, pois utiliza todos os serviços das áreas visitadas e cria novos. Quando realizado de modo cooperativo, essa atividade passa a beneficiar igualmente o grupo cooperado, não deixando a renda concentrada apenas nos empresários do turismo, como faz comumente. Algumas comunidades cearenses descobriram na cooperativa uma forma de desenvolver o turismo sem concentrar renda, pois nela os benefícios são usufruídos de forma coletiva. Assim, surgiram as cooperativas de turismo. Em todo o país ocorre uma tendência à ampliação e diversificação de cooperativas e acredita-se que elas são um caminho que pode levar à socialização das riquezas, e dar consciência da importância do crescimento econômico socializado para melhorar o bem-estar coletivo e, assim, tornar a sociedade mais humanizada e mais sustentável.
As cooperativas são, atualmente, uma realidade em todo o mundo e cada vez mais se fortalecem como forma de organização empresarial que objetiva a justiça social e diminuição das desigualdades entre os homens. O grande desafio apontado por Singer é transformar a crise do trabalho na oportunidade de desenvolver um tipo de organização de trabalho anticapitalista, democrática e igualitária. É essa a proposta das cooperativas.
O Cooperativismo nasceu da necessidade de o homem unir esforços para alcançar um objetivo comum. No princípio este objetivo era a sobrevivência da espécie humana, á procura de alimento; depois se transformou na necessidade de enfrentamento às mudanças impostas pelo sistema econômico mundial. Nossos ancestrais ao utilizarem a caça para conseguir sua alimentação, organizavam-se em grupos que posteriormente se transformaram em tribos. A união das pessoas ou a organização grupal foi uma resposta inteligente do homem às dificuldades encontradas. Para nós, que vivemos o período técnico científico informacional (Santos: 1994,121), a necessidade de voltar a se agrupar, de reaprender a cooperação, de fazer alianças, pactos e parcerias fraternas ou de respeito mútuo faz-se uma imposição e ocorre novamente como forma de sobrevivência.
Cooperar é colaborar com outras pessoas. Provém da palavra latina “cooperare”, ou trabalhar com outros para alcançar resultados comuns de forma solidária, com unidade de objetivos e propósitos. Foi dessa forma de pensar e agir que surgiu o cooperativismo e se tornou um movimento internacional que busca constituir uma sociedade justa, livre e fraterna. Fundada em bases igualitárias, ela age através de empreendimentos que atendam às necessidades gerais dos cooperados, remunerando-os adequadamente. A cooperativa é um movimento econômico e social que luta pela mudança de estrutura da forma de produzir, comercializar e viver em sociedade.
Ao longo da história[1] registram-se experiências e tentativas de organizar o trabalho em comum. Na Antigüidade, o sistema de produção baseava-se na escravatura, não existindo o contrato livre de trabalho entre as pessoas. Entretanto, já nesse período, encontravam-se formas de associações econômicas com estruturas semelhantes às instituições cooperativas modernas.
A classe trabalhadora sempre reagiu às formas injustas e excludentes do capitalismo. Entre 1780/1880 as reações da classe operária foram protagonizadas, principalmente pelos trabalhadores qualificados, seus ideólogos, líderes políticos, sindicais e cooperadores. Atingida em sua base existencial, a classe operária reage em níveis distintos ao avanço do modo de produção capitalista. Primeiro, opondo-se ao industrialismo em si, em nome dos direitos adquiridos e dos fundamentos tradicionais do antigo regime, depois, somando a luta pela democracia, em grande medida impulsionada pela Revolução Francesa; e, por fim, desenvolvendo formas próprias, potencialmente anticapitalista, de organização social - o sindicalismo - e de organização da produção e distribuição - o cooperativismo (Singer: 1998, 68).
A história registra várias formas de reação dos excluídos. Em 1912 os trabalhadores procuraram opor-se ao capitalismo industrial tentando impedir o uso das máquinas, no chamado movimento "luddita". Operários aderiam ao owenismo, um movimento liderado por Robert Owen, um rico industrial e filantropo britânico, que, entre 1771 a 1858, pretendia abolir a pobreza mediante o emprego dos que não tinham proventos e eram sustentados pela beneficência das paróquias, vivendo em aldeias cooperativas, onde podiam em comunidade produzir em comum, consumir seus próprios produtos e trocar excedentes com outras aldeias cooperativas. Duas dessas aldeias foram dirigidas pessoalmente por Owen, uma denominada de New Harmony e a outra Harmony Hall. Estas comunidades foram financeiramente sustentadas e mantidas por generosas contribuições de ricos empresários. Esse primeiro momento foi marcado pela caridade, filantropia e paternalismo.
Essas experiências ofereceram ao mundo um modelo de aldeia cooperativa e esperavam que o exemplo frutificasse. Durante muitos anos essas aldeias foram centro de peregrinação de simpatizantes e de muitos curiosos. Isso contribuiu para que ao longo dos anos, movimentos socialistas, comunistas, anarquistas e religiosos iniciassem experiências comunitárias coletivistas em muitos países. Deriva dessa idéia o assentamento coletivo judaico na antiga Palestina, atual Israel.
Proliferaram as cooperativas ligadas ao sindicato de trabalhadores de ofício. A ideologia organizacional dos sindicatos e das cooperativas operárias era muito forte.A consciência sindical exigia uma práxis que se voltava também para a organização das cooperativas. Quem diz isso é Paul Singer explicando a revolução social socialista em seu livro: Uma Utopia Militante (1998). Outra forma de reação e de resistência à revolução capitalista foi criar os sindicatos. Estes foram fortemente influenciados pelas idéias de Owen. Diz Singer que como a oposição ao industrialismo mostrava-se inviável, a única opção que restava aos trabalhadores era desenvolver um projeto de sociedade em que seus interesses pudessem ser realizados através do aproveitamento das forças produzidas pelas maquinas e pelos motores. Assim, foi preciso desenvolver as cooperativas que tinham sua origem também nas reações defensivas de trabalhadores. No caso lutavam contra preços altos de bens de primeira necessidade. A mais antiga cooperativa com a existência documentada parece ter sido iniciativa de trabalhadores, empregados nos estaleiros de Woolwich e Chatham, que, em 1760, fundaram moinhos de cereais em base cooperativa para não ter que pagar os altos preços cobrados pelos moleiros. E a mais antiga cooperativa de consumo inglesa foi a Oldham Co-operative Supply Company de 1795 (Singer: 1998 89).
A partir dessas, proliferaram muitas cooperativas na Europa. As cooperativas eram diferentes das "sociedades cooperativas". Essas freqüentemente eram formadas por pessoas dependentes de contribuições filantrópicas para se abastecer e subsistir.
O cooperativismo é um importante fenômeno de socialização que tenta corrigir os contrastes de riqueza e pobreza, dando consciência da importância da solidariedade na solução das questões econômicas, políticas e sociais na escalada do desenvolvimento das comunidades. Apresenta soluções viáveis e atuais, ajudando diminuir o índice de pobreza dos associados; promovendo a produção de riqueza sem acumulação, redistribuindo renda, oferecendo espaço para a prática da democracia.
As cooperativas[2] surgiram da luta de classes e foram criadas para enfrentar e eliminar a empresa capitalista de mercado. Diz Singer que a idéia parecia ingênua, mas empolgou os trabalhadores britânicos. As cooperativas operárias desempenharam um papel importante visando reunir fundos para estabelecer "aldeias de cooperação" que organizavam armazéns cooperativos. Algumas se transformavam em "bazares de escambo" e promoviam o intercâmbio dos produtos de diferentes ofícios. Desenvolviam-se as cooperativas de produção e consumo. Os produtores não só tinham acesso a um mercado organizado, formado por eles próprios como recebiam crédito em notas de tempo de trabalho. A avaliação, em tempo de trabalho, seria, mais tarde codificada como um dos princípios do cooperativismo: a prática de preços justos.
Os mestres demitiam, em massa, os trabalhadores sindicalizados que respondiam organizando cooperativas e procurando tomar o mercado dos patrões. Tentavam sustentar os demitidos e impedir que os desempregados pudessem colocar em seu lugar outros trabalhadores não sindicalizados. Contudo, a ação conjunta do Estado e do capital derrotou a coligação socialista de sindicatos e cooperativas, na Europa (Singer: 1998,100).
Para que os trabalhadores em suas cooperativas pudessem disputar o mercado com os capitalistas, precisavam dispor de capital suficiente, o que não existia. Por isso, ofícios inteiros foram vítimas de locaute. A escala de confronto era definida pelos capitalistas que venciam os trabalhadores pela fome. O que aparentemente parecia apenas um armazém, idealizado para oferecer aos seus associados artigos de primeira necessidade e outros serviços de ordem econômica social, transformou-se na própria semente do movimento cooperativista. Com objetivos claros e eticamente discutidos, esses trabalhadores economizaram durante doze meses e criaram uma sociedade que atuaria no mercado, tendo o homem como principal finalidade e não, o lucro, como no mercado capitalista. Era um pequeno comércio que fornecia produtos de primeira necessidade a preços pouco maiores que o preço de custo. Esta foi a primeira cooperativa instalada e, devido à sua natureza, que era resolver o problema de abastecimento, classificara-se como uma Cooperativa de Consumo.
Ao iniciarem seu negócio, os cooperados foram levados ao deboche por parte dos demais comerciantes. Contudo, para surpresa geral, logo no primeiro ano de funcionamento o capital da cooperativa aumentou para 180 libras e cerca de dez anos mais tarde o “Armazém de Rochdale” já contava com 1.400 participantes. A sociedade prosperava economicamente, funcionando de forma democrática e exercendo sua função social. Estes trabalhadores estabeleceram as bases doutrinárias ou normas do Cooperativismo. As cooperativas autênticas, atualmente, são ainda de base Rochdalianas. Elas apenas se adaptam aos tempos atuais. Vale ressaltar que o capitalismo coopta algumas delas, desvirtuando-as, ou rotula outros tipos de associação como cooperativas, essas que visam apenas a viabilizar o lucro para os sócios, mas, sem adotar a filosofia do cooperativismo.
O cooperativismo sempre representou uma reação à ganância capitalista que, naquela época, submetia inclusive crianças e mulheres a jornadas de até 16 horas de trabalho. O êxito dessa iniciativa passou a ser um exemplo para outros grupos. O espírito da cooperativa é sempre socializar os lucros e não, maximizá-los.
As cooperativas de consumo multiplicaram-se pela Europa de forma tão intensa que, em 1881, já existiam cerca de mil sociedades e 550 mil cooperados. O cooperativismo evoluiu e conquistou um espaço próprio, definido por uma nova forma de pensar o homem, o trabalho, o crescimento econômico e o desenvolvimento local.
Os valores de ajuda mútua e igualdade de direitos e deveres cultivados pelos tecelões foram tão fundamentais, que, mesmo passados mais de 100 anos, permanecem como o cerne desse movimento, que se expandiu pelo mundo, através dos tempos e diferentes campos da atividade humana.
Quando o cooperativismo ressurgiu na Inglaterra e na França nos primeiros momentos da Revolução Industrial, havia um período de crise tão intensa para a classe trabalhadora quanto hoje. É interessante observar que, quando dezenas de milhares de trabalhadores foram expulsos do mercado pelas novas máquinas e indústrias capitalistas, organizaram-se por conta própria, coletivamente, em empresas cooperativas. Novamente, com as crises geradas pela Terceira Revolução Industrial, pelo impacto das novas tecnologias sobre o trabalho, as cooperativas ressurgiram como alternativa.
De acordo com Singer (1998,100) os Pioneiros de Rochdale inovaram, ao adotar regras que evitavam as fragilidades causadoras do fracasso de inúmeras tentativas anteriores. As cooperativas são regidas pelos princípios de adesão voluntária e livre; gestão democrática, participação econômica, autonomia, independência, educação, formação, informação, intercooperação e interesse pela comunidade. Os pioneiros do cooperativismo acreditavam que os membros dessas sociedades deveriam internalizar valores fundamentais, como a ética, a honestidade, a transparência, a responsabilidade social, o trabalho e o conhecimento filosófico da cooperativa.
A principal vantagem das cooperativas é proporcionar uma vida melhor para seus sócios ou conseguir melhor nível de renda, suprimir os intermediários de maneira a reduzir ao mínimo os órgãos de transmissão das riquezas do produtor ao consumidor. É ainda sua missão educar economicamente o sócio, tornando-o apto para a autogestão econômica e política; estabelecer o justo preço, remunerar convenientemente todo trabalho empregado à produção; e eliminar o lucro capitalista, criando a preocupação com a satisfação das necessidades básicas do homem.
Há uma entidade nacional que congrega todas as cooperativas brasileiras: Organização das Cooperativas do Brasil (OCB). Constituída em 02 de dezembro de 1969, durante o IV Congresso Nacional de Cooperativismo, esta organização tem como finalidade representar todo o sistema cooperativista do País. Por ocasião desse Congresso, foi proposta a reformulação da Legislação Cooperativista, pleito conquistado, mais tarde, através da promulgação da Lei 5.764 de 16 de dezembro de 1971. A Lei Cooperativista, como ficou popularmente conhecida, define a política nacional de cooperativismo, institui o regime jurídico das sociedades cooperativistas, sua criação e seu funcionamento. Neste ato, oficializaram-se a existência e a função da Organização das Cooperativas do Brasil (OCB) e do sistema de representação estadual, que tem como órgão máximo, no Ceará, a Organização das Cooperativas do Estado do Ceará (OCEC).
A primeira cooperativa no Ceará[3] foi a Cooperativa Bancária Ltda. Fundada em 1943, tinha sede na Rua Floriano Peixoto, no centro de Fortaleza, e teve como seu primeiro Presidente o Sr. Nilton Frota Queiroz. Em 1945, surge a primeira cooperativa agropecuária do Estado, na cidade de Guaramiranga. Ainda no final da década de 40, foi criada a Cooperativa de Crédito de Fortaleza Ltda. que se transformou no Banco Popular de Fortaleza (BANFORT). A Cooperativa de Crédito e Consumo Social Ltda. surge em 1951 (Feitosa et all 1998, 16).
Em 1954 organiza-se a Cooperativa de Credito Agrícola do Estado do Ceará, que posteriormente, transformou-se no Banco da Parnaíba. Este, por sua vez, foi adquirido pelo Banco Portugal. Atualmente, além da OCEC, outras instituições dão apoio ao processo de instalação de Cooperativas no Estado, tais como a Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares do Ceará, que desenvolve um trabalho de assessoria técnica junto aos grupos que desejam constituir uma Cooperativa.
As cooperativas, de acordo com a Lei 5.764/71, são Singulares, ou formadas por pessoas físicas e Centrais ou Federações de Cooperativas ou constituídas de, no mínimo três cooperativas singulares e Confederações de Cooperativas, aquelas compostas de, pelo menos, três centrais ou federações de cooperativas.
As cooperativas também podem ser classificadas conforme os objetivos ou gêneros de suas atividades e de seus associados. Dessa forma, são classificadas como: de consumo, de produção animal, de produção vegetal, de produção mineral, de prestação de serviços, habitacionais, de crédito, de eletrificação rural, e de turismo. As cooperativas, ao se constituírem, planejam e administram suas atividades baseadas nos valores e princípios do cooperativismo. Compete aos cooperados definir as políticas, as diretrizes, tomar decisões e manter um permanente controle da cooperativa.
A história tem demonstrado que se torna mais fácil para os países e lugares avançarem e se desenvolverem mais facilmente, na medida que se afastam dos grandes países, dos dominadores, dos modelos padrões, que só assim conseguem crescer e melhorar suas condições. Assim, para poderem avançar, as cooperativas necessitam fugir dos modelos da economia clássica e procurar desenvolver formas diferentes de produção e distribuição das riquezas. O desafio ideológico é formular um projeto de sociedade que respeite as liberdades individuais políticas e econômicas conquistadas pelos trabalhadores no capitalismo hodierno e lhes oferecer inserção no processo produtivo em termos de pleno emprego, participação nas decisões que afetam seus destinos, também no nível da empresa e um patamar mínimo de rendimento que lhes proporcione um padrão "normal" de vida.(Singer: 1998 110).
O referido autor, em seu estudo sobre as cooperativas, mostra como as aldeias cooperativas, assim como, os sindicatos e as cooperativas, deram uma grande contribuição às mudanças sociais, mostrando que é possível organizar atividades sócio-econômicas segundo princípios que fujam do modelo econômico clássico.
Exerceram influências sobre o cooperativismo moderno Robert Owen (considerado ”o pai do cooperativismo”), François Marie Charles Fourier, Phelippe Josepnh Benjamins Buchez, Louis Blanc, John Bellers, Saint Simon e William King . Atualmente um dos maiores estudiosos das cooperativas no Brasil é Paul Singer e pessoas envolvidas com a pastoral dos trabalhadores.
No Ceará, o movimento cooperativista chegou à atividade turística, que é uma das atividades econômicas recentes e peculiares do século XX. Afirma a OCEC que, em seu catálogo de cooperativas, estão registradas algumas cooperativas de turismo destacando-se: :
· Cooperativa de Turismo de Icapuí – COPITUR (Icapuí/Ce).
· Cooperativa dos Profissionais em Serviços Turísticos do Ceará - COOSERT (Beberibe/Ce).
· Cooperativa de Trabalho, Assistência ao Turismo e Prestação de Serviços Gerais (Ubajara/Ce).
· Cooperativa de Trabalhadores e Serviços Hoteleiros e Turismo do Estado do Ceará (Fortaleza/Ce).
· Cooperativa de Transporte Alternativo e de Serviços Turísticos de Maracanaú (Maracanaú/Ce) .
Muitos municípios cearenses tornaram-se núcleos receptores de turismo. Em alguns deles o turismo implantou-se de forma intensiva e a contra gosto de residentes, que viam o turismo apenas como uma atividade degradadora da natureza, segregadora dos espaços e invasora dos negócios locais.
Os resorts e os grandes hotéis, ao se implantarem, assumem parceria com o setor público e procuram tirar o máximo de vantagens dessa alocação, conseguindo, quase sempre, incentivos fiscais e disponibilização de infra-estrutura, sob o pretexto de colocar o novo e exótico local no mercado internacional. Para os governos, isso é o suficiente. No entanto, essas grandes empresas esquecem-se de incluir os residentes nos seus projetos e os governos, de exigir que sejam feitas parcerias com as comunidades receptoras. Esse comportamento invasor das empresas, acrescido ao distanciamento que alguns turistas elitistas desejam manter com as comunidades, por considerá-las carentes e perigosas, gerou, nos residentes, uma aversão ao turismo.
O que se assistiu, em um primeiro momento do processo de implementação do turismo no Estado do Ceará, foi uma difícil relação entre algumas comunidades nativas e os exploradores dos serviços turísticos, e, como decorrência disso, um afastamento entre residentes e turistas. Passada a fase conflitiva mais aguda e compreendido que a oposição ao turismo era inviável, assim como foi inviável a oposição a industrialização, passada a apatia frente ao fenômeno, essas comunidades perceberam sua impotência para barrar o turismo, verificaram que podiam optar pela alternativa de aproveitar o turismo em seu próprio beneficio, isto é, que ele poderia beneficiá-las, gerando empregos e aumentando a circulação de dinheiro nesses pólos. A partir dessa compreensão, começaram a encontrar caminhos, descobriram que também podiam oferecer serviços aos turistas e suas idéias materializaram-se em pousadas, restaurantes, bares, palhoças, bodegas, bazares, além de comidas gostosas e a produção de um variado artesanato, que, até certo ponto, era desprestigiado. Passaram a diversificar sua base econômica e criar mecanismos para se adaptar às novas condições impostas pelo momento atual da sociedade globalizada.
Nas comunidades em que havia uma organização comunitária, uma consciência do associativismo, a cooperativa de turismo foi um caminho. Onde os residentes não são capazes de oferecer os serviços turísticos, surgem grupos externos, empresas e investidores que passam a explorar o turismo nos seus lugares. Assim, forças externas colocam as comunidades em dificuldades, levando-as a compreender que o local não é apenas o cenário das atividades, que cada lugar precisa se organizar, gestar sua vida socioeconômica, promover seus produtos, criar uma imagem diferenciada e levar seus habitantes a serem os protagonistas.
Os pequenos negócios passaram a ser o motor do processo de geração de empregos e, em muitas comunidades tradicionais, eles estão sendo pensados de forma associativa e participativa. Surgiu o turismo participativo, ou seja, os serviços turísticos planejados, criados e executados de acordo com a vontade dos residentes e os lucros socializados entre aqueles que prestam os serviços.
A Embratur, ao lançar o Programa Nacional de Municipalização do Turismo - PNMT estimula as comunidades a desenvolverem um plano de turismo local, desenvolvendo a idéia de que o turismo é um bom negócio para as pequenas cidades, para as pequenas comunidades e que famílias e pequenos grupos locais podem investir no turismo. Como resultado desse processo de maturação, algumas comunidades organizaram e criaram as cooperativas de turismo para poder entrar no mercado do turismo, que é altamente competitivo.
Em algumas comunidades, o turismo tem sido um dos vetores do desenvolvimento local, porque oferece oportunidade de emprego para muitas famílias, consegue criar um ambiente de qualidade para as pessoas que ali vivem e trabalham, e dá perspectivas de luta por dias melhores. Os grupo locais identificam seus problemas coletivos, buscam soluções, avaliam alternativas, exigem infra-estruturas, defendem o meio ambiente e promovem programas para melhorar a educação, promover a cultura local e produzir riqueza de forma cooperativa e associativa.
As cooperativas de turismo no Ceará são ainda incipientes. Mas começam a criar condições para a geração de trabalho e melhoria da renda de algumas famílias, através do turismo, sobretudo para aqueles que estavam excluídos do mercado. Em muitas comunidades, algumas famílias resolveram construir hospedarias, em suas residências para criar condições físicas de hospedar os turistas, como fez Icapuí, com o projeto Em Cada Casa uma Estrela, que criou o turismo residencial. Ali, o visitante participa um pouco do convívio com a família do pescador, saboreia a comida caseira, sente sensações diferentes das sentidas nos hotéis de luxo, porque o que impressiona é a presença e o calor humano que, muitas vezes, gera amizades duradouras. Outras comunidades construíram pousadas, bares, restaurantes, revalorizaram o artesanato, a gastronomia local, resgataram o folclore, tendo em vista o turismo.
As cooperativas de turismo associam pessoas com interesses comuns para juntar idéias, capitais, vontades e sonhos e, a partir dessa base, desenvolver uma atividade lucrativa, que dá sustentação ao crescimento econômico e sócio cultural de um grupo.A contribuição financeira de cada sócio cooperativado vai formar o capital social. A quota-parte é o menor valor que cada associado pode subscrever. Cada cooperativa disponibiliza os fundos de reserva e assistência técnica, educacional e social para dinamizar as atividades educativas e culturais, que visam ao bem comum.
Na comunidade da Praínha, onde existe uma organização de bordadeiras, a cooperativa compra os instrumentos de trabalho coletivamente. São artesãs que se reúnem para produzir coletivamente, lucrar ou perder associativamente. A cooperativa compra o material necessário ao trabalho, como linhas, agulhas, lãs, bastidores e fornece as cooperadas. Assim, ninguém deixa de trabalhar por falta de material. A produção é coletiva, o lucro é socializado e a cultura de bordar, fazer crochê, labirinto e renda é conservada.
Assim, as comunidades receptoras de turismo do Ceará adotam duas estratégias para desenvolver o turismo de forma associativa. A primeira, organizando um turismo participativo, onde todos se sentem capazes de contribuir, entendendo que são aqueles que conhecem a cultura e o espaço ecológico das comunidades, os melhores organizadores das estratégias de desenvolvimento turístico local. Quando esses grupos são assessorados por técnicos com conhecimento de gestão participativa, quando a filosofia cooperativista é entendida por todos, a comunidade avança econômica e culturalmente . A segunda forma é organizando as cooperativas que são organizações de grupos de pessoas com atividades comuns, cada um com um pequeno capital, para formar um capital maior, capaz de prestar um serviço turístico, remunerando e beneficiando de forma justa, ou seja, de acordo com as cotas de participação dos cooperados e com os serviços prestados. Quem entra com mais capital recebe mais, é tudo proporcional e autofiscalizado.
Mas é preciso atentar para o que diz Kotler et all (1994, 23) não existem panacéias, doutrinas, receitas ou simplesmente elixir mágicos. Ao contrário as comunidades são orientadas por um amálgama de teorias econômicas, tendências democráticas e industriais, previsões e opiniões políticas, casos e experiências práticas. Diante do leque de possibilidades, os pólos receptores de turismo precisam optar, de forma inteligente, por soluções locais diferenciadas e alternativas. Algumas comunidades nem conseguiram partir para essa luta ficando a lamentar as dificuldades, enquanto outras avançam e conquistam mercados e posições favoráveis nessa competição.
Espera-se, em pouco tempo, colher os resultados das cooperativas de turismo do Ceará, para que sirvam de caminho a outros núcleos receptores que não conseguiram dar ainda seus primeiro passos no desenvolvimento do turismo de base local.
BIBLIOGRAFIA
CORIOLANO, Luzia Neide M. T. Turismo e Desenvolvimento Local : atores e cenários em mudanças. Fortaleza, Inédito.
FEITOSA, C. R, AMORIM M. E. P, MOREIRA, T. M. X, BORGES, L . S. Cooperativismo. Cadernos Tecnológicos. Fortaleza,1998. Inédito.
KOTLER, P. DONALD H. HAIDER . IRVING R. Marketing Público : como atrair investimentos, empresas e turismo para as cidades. São Paulo: Makron Books, 1994.
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SINGER, PAUL I. Dinâmica populacional no desenvolvimento econômico. São Paulo: Hucitec, 1980.
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SODRÉ, Muniz. Reinventando @ Cultura.Petrópolis; Vozes 1998.
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NOTAS
[1] Registra a história que na Palestina, entre 356-425 da era cristã, haviam associações mútuas, entre caravanas de mercadores para o seguro do gado. Na Grécia e na Roma antigas, pessoas de camadas sociais pobres agrupavam-se para melhor resolverem seus problemas, destacando-se a união para facilitar enterrarem seus mortos. Objetivos variados levam as pessoas a se associar. Durante o feudalismo, apesar do regime de servidão dominante, a organização do trabalho e da sobrevivência entre os servos, se desenvolvia sob forma igualitária e cooperativa. A comuna, unidade econômica da Idade Média, era explorada por seus habitantes de forma comum nos campos, nos bosques, para uma produção coletiva. Os mosteiros de todas as religiões e de todos os tempos, do ponto de vista econômico, também constituíam espécies de cooperativas integrais, onde a produção e o consumo processavam-se em comum.
[2] O cooperativismo nasceu na Inglaterra e a origem do que hoje chamamos de cooperativa moderna, data de 21 de dezembro de 1844. Nessa época, 27 tecelões e uma tecelã do bairro de Rochdale, portanto, 28 trabalhadores de Manchester, na Inglaterra, fundaram a “Sociedade dos Pioneiros de Rochdale”. Eles se organizaram a fim de reagir contra as injustiças e o mau trato nas fábricas para, assim, saírem da exploração capitalista. Essas iniciativas certamente, adaptam-se ao contexto atual, precisando ser melhor estruturadas, com mais organicidade e sobretudo com base em um maior conhecimento sobre os princípios do cooperativismo. Muitas cooperativas quebraram economicamente, outras se degeneram pela falta de conhecimento da ciência cooperativista. Lembra Singer, defensor das cooperativas, que elas não são um processo simples. A cooperativa não é meramente uma empresa capitalista, que tem os próprios trabalhadores como sócios. Essa visão equivocada tem dificultado seu andamento. A rigor a filosofia da cooperativa é a de uma empresa socialista. Todos os seus princípios são totalmente diferentes dos princípios da empresa capitalista. Quando ela foge aos seus verdadeiros princípios, normalmente não se segura e isso vem acontecendo, muitas delas terminam cooptadas pelo sistema e transformando-se em empresas capitalistas.
[3] No Brasil, ainda no século XIX, surgiram importantes experiências de cooperativismo como o de Palmital, em Santa Catarina, localidade conhecida como uma colônia de produção e consumo, tendo a frente o imigrante francês Jules de Mure, seguido da doutrina de seu compatriota Charles Fourier. A Colônia de Tereza Cristina no Paraná, inspirada nas idéias anarquistas de Charles Fourier, do médico Dean Maurice Faivre implementou, em 1847, uma rica e histórica experiência cooperativa. Em Limeira interior de São Paulo foi criada em 1891 a primeira cooperativa do Brasil com o nome de Associação Cooperativa Internacional Telefônica de Limeira. No Rio de Janeiro, em 1894, os militares implantaram a Cooperativa Militar de Consumo do Distrito Federal. Em Camaragibe no Estado de Pernambuco ainda em 1895 foi criada a Cooperativa de Consumo de Camaragibe. Em Nova Petrópolis no Rio Grande do Sul, em 1902, por orientação do padre Theodor Amstardt, foi implantada a Cooperativa de Crédito Rural de Nova Petrópolis, ainda hoje em funcionamento. Em Antônio Prado no Rio Grande do Sul, o professor José Celso Schneidor ressalta que de acordo com Luís Salgado Klaes, foi criada a primeira cooperativa na área rural, no ano de 1892, com a denominação de Societá Cooperativa delle Concezioni Agricoli Industrali.
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